‘Os Amigos da Fóia’, fardados com o sê bonézinho deles, nem sê o que les diga… Sã do melhor que possa ser e haver…
Inda agora aqui cheguí
já les vô a prècurar
se tã bonzinhos de saúde
dã lecença dê cantar…
– Ó parente Zé, cantar o quem?!… Isso foi ontem à nôte. Hoje já é Dia de Rês e, daquem nada, é solposto…
– E quem é que le diz o contráiro?… Sará de caso quê cá já nã possa arremedar aqui um coisinho daquilo queles cantaram, a noite passada, lá no café da Fonte dos Chorons?…
– Poder, pode. Mái que mechas de estilo é esse que mecêa usa qu’ até faz cocégas nas orelhas duma pessoa?!…
– Lá sabe vomecêa um estilo melhor… Cante-o lá quê cá sempe gostava de ver. Vá, parente Jôquim, vá. Mostre lá a sua vertude!…
Isto era a conversa do parente Zé Caçapo, o ‘Verruma’ le chamam, com o mê compade Jôquim do Barranco, im Dia de Rês, os dôs afincados a buber uns copinhos ali no café de cima, já im mêa tarde, qué que me quem diz, quái à noitinha, qu’ isto, agora, os dias nã sã nada. Tã penas o sol cmeça a decer, assim se põe, im menes dum foguete.
Lá de baxo, do Algarve, vieram ‘As Figueirinhas’ e ‘Os Amigos da Figueira’. Que bela jolda..
Pro jêto, tanto se faz um cmo ôtro, tinham ido, na ôta noite atrás, ver as joldas que vieram ali ô restairante da Fonte dos Chorons cantar os Rês. Os Rês e as Janêras, qu’ isto, agora, já a famila nã tá pa se dar ô trabalho d’ andar aí de porta im porta a cantar tal coisa, na passaja do ano e na nôte de rês, às tensas de le darem um convindado que vá nem venha… E, atão, fazem tudo pre junto.
Ora, a Junta arrenja manêra da famila s’ ajuntar ali no dito restairante e, quem quêra, dá o nome e vai lá cantar. Aquilo, com jêtinho e nã dêxando a coisa munto pô fim, cmê cá fiz desta vez, inda se panha uma felhòzinha pa dar ô dente e um calcesinho de melosa pa alimpar as goélas. Premode, tudo dado pra Junta. E fazem eles munto bem. Que nunca le dôia as manitas…
Pôs ê cá tamém parcí pre lá este ano. Mái fui sòzinho qua minha Maria nã teve jêto de largar o monte e fecô im casa nã sê se dando pontos ó fazendo ôto governo quasequer. Ô certo, ô certo, é quê cá, quando chiguí a casa, já bem de madrugada – era quái uma hora, nã cudem… – já ela tava, munto bem sa senhora boa vida, espatarrada im cimba da cama, a dromir, com a telvisão num barulho parvo. Mái, em ela tendo sono, nem que passe o comboio…
Os meçalhos da Jolda da Ludoteca tamém já cantavam qualquer coisinha. E tava lá uma mecinha qu’ era munto ingraçada…
E, vai daí, até qu’ aquilo foi uma coisa quê cá gostí. Más olhem que gostí ô bem fêto. Parceram lá umas joldazalhas de mecinhes e tal… quma pessoa já sabia que nã era coisa prí àlém, más é bom qué pa ver sos nôvos nã dêxam perder estes questumes qua famila tinha nos tempos dos avózes deles – que sô ê cá e ôtros cmo eu.
Mái tamém parceram lá ôtres, mormente duas joldas, qu’ eram de ver e chorar pre más. Olhem, uma vêo da Feguêra, lá de baxo, do Algarve. Tinha duas joldas masturadas. Uma de melheres, ôtra d’ homens. Foi uma coisa da pontinha da orelha!… Dava gosto, mês beles amigos. Assim, sim!… Chemavam-se ‘As Figueirinhas e Os amigos da Figueira’.
A ôtra, era de cá. Sã ‘Os amigos da Fóia’. Ah môces marafados!… Té se m’ arrepiaram os cabelos… Desataram a cantar ‘Os Rês’ – queles, atão, nã cantaram ‘As Janêras’ – nunca tinha visto uma coisa assim. Os apontadores eram do melhor, os foles eram uma classe, o estilo era do antigo, e os cantadores cantavam que nem passarinhos… E, nã cudem, tinham farda. Trajavam todos de boné igual…
Com um boné destes, uma felhó que nem um capacho e ôvindo joldas a cantar ‘Os Rês’, quem é que nã há-de tar sastefêto…
De manêras que, cmê cá já falí lá atrás, com aquela enfluêinça de ver tudo munto bem sem perder coisíssema nenhuma, fequí sem felhó. Uma mecinha que tava lá à porta da antrada, qondo ê cá chiguí, bem me dé um papelinho e disse-me assim ô ôvido:
– Em l’ apetecendo, apresente-se ali ô balcão com este papelinho queles dã-le uma felhòzinha e um copinho de qualquer coisa. É pre conta da Junta…
– Tá bem – disse ê cá – e Dés le pague m’t’agradecido.
E fequí-me a lember, uma preçanada de tempo, sempe com o fito na felhó e no tal calcesinho dela. Quê cá, atão, béque-me melosa nã gosto munto. Isso é bobida mái de melher. Agora, um calcesinho dela, da boa, isso cai que nem ginjas!…
Mái qonto mái me lembia, mái perdia… Ê cá havera era de ter ido logo lá tratar do caso. C’m’ nã fui, barimbí-me… Im vez disso pus-me a bispar tudo de fio a pavio… atrás duma jolda vinha ôtra, ora… qondo dí pre mim foi já no fim, já ‘Os Amigos da Fóia’ lá iam pra rua afora e ê cá atrás deles. Aí vê-me a felhó à idéa, abalí a fugir ô café, cheguí lá todo escalfado e prècuri à mecinha que tava do lado de drento do balcão:
O CNE e as Guias de Portugal apresentaram-se com esta jolda. Dá gosto ver qos nôvos tamém aprecêam estas coisas…
– Menina, atã inda há prí uma felhòzinha cá pô Parente?
– Felhós?!… A uma hora destas?!… Ai, Parente, tenha pacênça mái já nã há nada disso… Atã, agora é que vem?!…
– Olha que cachamorra esta… Atã ê cá cudava que, em tendo uma senha destas na mão, fecava sempe aí uma f’lhòzinha gôrdada pra mim…
– Põs era pa tar, era… Mái, atão, a uma hora destas, o qué que mecêa quer… Méme que tevesse sobrado alguma, já a gente tinha qua ter jogado pô balde das lavaduras…
– Nã me diga que jogaram a minha?!…
– Alguma vez?!… Onde sará quela vai a estas horas… Calhando, já tá até desmoída e tudo…
– Ai a minha pôca sorte!… Minha bela felhòzinha… Atã sê cá sabesse disso, nã tinha vindo logo aprevêtá-la assim que chiguí?!…
– Atã, pronto. À ôtra vez, já sabe. Nã se ponha a pôco qué pa nã dar nisto. E tome lá uma calcesinho de melosa pa nã perder tudo…
– Melosa?!… Nã pode ser de madronho, menina? É qua melosa é ruim pôs diabêtes. Quê cá, graças ô Devino Pai, nã tenho tal mal, mái quero-me furtar a ele…
– Atã, vá lá um copinho d’ aguardente…
E lá me deu um copinho. E, d’ agora im diante, mês belos amigos, nunca mái caio nôtra. Tã penas lá chegue, passem pra cá o que me acabedar…
Estes meçalhos nem nome tinham. E tamém nã cantavam nada que se dezesse benza-te Dés. Mái que eram bem caçados, lá isse eram…
Mái dêxando isso pa trás das costas e desquecendo uma desfortuna tã grande que foi um homem fecar sem felhó em Noite de Rês – vá lá, vá lá qu’ inda panhí o tal calcesinho dela – sempe les digo que coisas destas – a alembrar os nossos usos e questumes – nunca haveram d’ acabar…
E, isto, agora, é só uma conversa. De parvo, tá bom de ver… Mái, cá pa mê gosto, inda gabava de ver a nôte de rês sem aquela aparelhaja que tava lá no café. As joldas a cantarem c’m’ nôtres tempes. Sem alte-falantes, nem nada. Tenho cá pra mim, quera melhor. Mái a Junta é que sabe…
E tamém gostava de ver o qué qu’ ‘Os Amigos da Fóia’ eram capazes de fazer se tevessem um axilozinho da Junta ó da Cambra pa nã dêxarem este questume das janêras e dos rês levar semiço. Nã era preciso grandes coisas. Mái, cmá senhora Presidenta já me disse qu’ ia pensar no caso, posso dromir im sossego.
Agora, ôtra coisa. Ê cá tirí pa lá uns retratos e uns videozalhos. Fecô tudo uma prequêra, que, à uma, o artista é fraco, e, à ôtra, tava tudo munto pertado e às ‘scuras. E, agora, inda pre cimba, há uma remessa de dias quê cá ando a ver se dô posto aquilo no YouTube e o YouTube béque-me nã quer arreceber tal coisa.
De manêras que, vô-me pertando com esse tal do YouTube a ver se dô fêto alguma coisa dele, e, tã penas tudo teja arredondado, logo ponho aqui as ligaçons pa mecêas darem ido lá ver.
Os retratos já nos podem ver. Acalquem aqui na Galeria da Noite de Reis, fazendem favor.
E fecamos pre qui. Passem todos munto bem, com um ano intêro chêo de saúde e ôtras coisas boas e até qu’ a gente se veja.